Horas mortas... Curvada aos pés do MonteA planície é um brasido e, torturadas,As árvores sangrentas, revoltadas,Gritam a Deus a benção duma fonte!E quando, manhã alta, o sol posponteA oiro a giesta, a arder, pelas estradas,Esfíngicas, recortam desgrenhadasOs trágicos perfis no horizonte!Árvores! Corações, almas que choram,Almas iguais à minha, almas que imploramEm vão remédio para tanta mágoa!Árvores! Não choreis! Olhai e vede:--- Também ando a gritar, morta de sede,Pedindo a Deus a minha gota de água! Florbela Espanca
Gosto de ouvir o português do Brasil Onde as palavras recuperam sua substância total Concretas com frutos nítidos como pássarosGosto de ouvir a palavra com suas sílabas todasSem perder sequer um quinto de vogalSophia de Mello Breyner Andersen
Na mão de Deus, na sua mão direita,
Descansou afinal meu coração.
Do palácio encantado da Ilusão
Desci a passo e passo a escada estreita.Como as flores mortais, com que se enfeita
A ignorância infantil, despôjo vão,
Depus do Ideal e da Paixão
A forma transitória e imperfeita.Como criança, em lôbrega jornada,
Que a mãe leva ao colo agasalhada
E atravessa, sorrindo vagamente,Selvas, mares, areias do deserto...
Dorme o teu sono, coração liberto,
Dorme na mão de Deus eternamente!Antero de Quental