28.12.12

Em mim...

Nasci...olhei para me ver
Era...já não sou
Em mim ficou
O que era antes de ser...
MJB

3.11.12

VIDA


Vida que não acaba de acabar-se,
Chegando já de vós a despedir-se,
Ou deixa por sentida de sentir-se,
Ou pode de imortal acreditar-se.

Vida que já não chega a terminar-se,
Pois chega já de vós a dividir-se.
Ou procura vivendo consumir-se,
Ou pretende matando eternizar-se.
 
O certo é, Senhor, que não fenece,
Antes no que padece se reporta,
Porque não se limite o que padece.

Mas, viver entre lágrimas, que importa?
Se  vida  que entre ausências permanece
É só viva ao pesar, ao gosto morta?
 Soror Violante do Céu ((1601-1693)
in «Cem  Poemas Portugueses no Feminino»,
Selec., Organiz. e introd. de José Fanha e José Jorge Letria


28.10.12

No país dos poemas tristes


Qualquer poema esquecido
precisa de uma réstia de sol
onde pousar a tristeza

Mas no país dos poemas tristes
a inércia dormente
deixou que roubassem o sol
E agora
os rios solidificam nos leitos
os animais são pedras
e as searas secam

Agora
no país dos poemas tristes
da sombra negra do céu
desprendem-se versos mortos
que os poetas recolhem
paulatinamente
para colocar entre as páginas brancas
de um livro por escrever

Talvez despertem um dia
ao som de Chopin
Fantasie-Impromptu, quem sabe?
Quando o sol for devolvido ao céu
e à poesia renascerem as asas

Lídia Borges

6.10.12

ACORDAI



Acordai
acordai
homens que dormis
a embalar a dor
dos silêncios vis
vinde no clamor
das almas viris
arrancar a flor
que dorme na raíz

Acordai
acordai
raios e tufões
que dormis no ar
e nas multidões
vinde incendiar
de astros e canções
as pedras do mar
o mundo e os corações

Acordai
acendei
de almas e de sóis
este mar sem cais
nem luz de faróis
e acordai depois
das lutas finais
os nossos heróis
que dormem nos covais
Acordai!


José Gomes Ferreira

22.6.12

...amargurada

Já o palor da madrugada
anunciava o novo dia
inda minha alma amargurada
ajoelhava e não dormia...


M.J.B.

24.5.12

ÉVORA


Évora! Ruas ermas sob os céus
Cor de violetas roxas... Ruas frades
Pedindo em triste penitência a Deus
Que nos perdoe as míseras vaidades!

Tenho corrido em vão tantas cidades!
E só aqui recordo os beijos teus,
E só aqui eu sinto que são meus
Os sonhos que sonhei noutras idades!

Évora!... O teu olhar... o teu perfil...
Tua boca sinuosa, um mês de Abril
Que o coração no peito me alvoroça!

...Em cada viela o vulto dum fantasma...
E a minha alma soturna escuta e pasma...
E sente-se passar menina-e-moça...

Florbela Espanca

11.4.12

O gato - Para a Ana

O gato, à sua janela,
ao Sol, que brilha fulgindo,
vai dormindo,
vai pensando
e vai sonhando:

- «Pelas noites de invernia,
quando o vento, num lamento
muito lento, muito longo,
muito fundo, de agonia,
ruge e muge,
e a chuva bate à janela,
nos vidros fina a tinir...,
ai com é bom,
ai como é bom dormir
ao serão, todo enroscado
ao pé do lume doirado,
fazendo ron-ron, ron-ron..."

-«Ó minha linda casinha,
tu és minha, muito minha,
nem há outra melhor que ela ...»

O gato, à sua janela,
ao Sol, que brilha fulgindo,
vai pensando,
vai dormindo
e vai sonhando:

- «Não tenho inveja a ninguém:
nem aos pássaros no ar
a voar,
nem aos cavalos saltando,
galopando,
nem as peixinhos no mar
a nadar;
não tenho inveja a ninguém,
aqui da minha janela
onde me sinto tão bem ...»

- «Ó minha linda casinha,
tu és minha, muito minha,
nem há outra melhor que ela ...» 

Afonso Lopes Vieira em "Animais nossos amigos" 


Dedicado à Ana e aos seus múltiplos felinos.

1.2.12

Noite de chuva


 Chuva... Que gotas grossas!... Vem ouvir:
Uma... duas... mais outra que desceu...
É Viviana, é Melusina a rir,
São rosas brancas dum rosal do céu...

Os lilases deixaram-se dormir...
Nem um frémito... a terra emudeceu...
Amor! Vem ver estrelas a cair:
Uma... duas... mais outra que desceu...

Fala baixo, juntinho ao meu ouvido,
Que essa fala de amor seja um gemido,
Um murmúrio, um soluço, um ai desfeito...

Ah, deixa à noite o seu encanto triste!
E a mim... o teu amor que mal existe,
Chuva a cair na noite do meu peito!
Florbela Espanca

Quero só trazer à memória o que me dá esperança...

Hino da Restauração da Independência



A PORTUGUESA