20.2.08

de Augusto Gil


O PASSEIO DE SANTO ANTÓNIO




  • Saíra Santo António do convento
    a dar o seu passeio costumado
    e a decorar num tom rezado e lento
    um cândido sermão sobre o pecado.
    Andando,andando sempre, repetia
    o divino sermão piedoso e brando
    e nem notou que a tarde esmorecia,
    que vinha a noite plácida baixando...
    ................................................................
    O luar, um luar claríssimo nasceu.
    Num raio dessa linda claridade,
    o Menino Jesus baixou do céu,
    ...............................................................
    Perto, uma bica de água murmurante
    juntava o seu murmúrio ao dos pinhais.
    Os rouxinóis ouviam-se distante.
    O luar, mais alto, iluminava mais.
    De braço dado para a fonte vinha
    um par de noivos todo satisfeito.
    Ela trazia ao ombro a cantarinha,
    ele trazia o coração no peito !
    Sem suspeitarem de que alguém os visse,
    trocaram beijos, ao luar tranquilo.
    O Menino, porém, ouviu e disse:
    _ Ó Frei António, o que foi aquilo?
    O Santo, erguendo a manga do burel
    para tapar o noivo e a namorada,
    mentiu com a voz doce como omel:
    _ Não sei que fosse.Eu cá não ouvi nada...
    Uma risada límpida e sonora
    vibrou, em notas de oiro pelo caminho.
    _ Ouviste ,Frei António ? Ouviste agora?
    _Ouvi,Senhor,ouvi.É um passarinho...
    _ Tu não estás com a cabeça boa!
    Um passarinho a cantar assim?
    E o pobre Santo António de Lisboa
    calou~se, embaraçado, mas por fim.
    corado, como as vestes dos cardeais,
    achou esta saída redentora :
    Se o Menino Jesus pergunta mais,
    queixo-me a sua Mãe, Nossa Senhora
    .

(Imagem protectora do Regimento de Infantaria n.º 19, que tinha o seu quartel em Cascais desde meados do século XVII. A imagem do santo acompanhou o regimento de Cascais durante as campanhas da Guerra Peninsular, sendo por isso que ostenta ao peito a medalha da Guerra Peninsular. Santo António tinha o posto de tenente-coronel no regimento, servindo o seu soldo para ajuda aos soldados doentes. A festa do Santo comemora-se em 13 de Junho. - no Portal da História - )

9.2.08



O TEU OLHAR


Quando fito o teu olhar,
Duma tristeza fatal,
Dum tão íntimo sonhar,
Penso logo no luar
Bendito de Portugal!


O mesmo tom de tristeza,
O mesmo vago sonhar,
Que me traz a alma presa
Às festas da Natureza
E à doce luz desse olhar!


Se algum dia, por meu mal,
A doce luz me faltar
Desse teu olhar ideal,
Não se esqueça Portugal
De dizer ao seu luar


Que à noite, me vá depor
Na campa em que eu dormitar,
Essa tristeza, essa dor,
Essa amargura, esse amor,
Que eu lia no teu olhar!
Florbela Espanca

5.2.08

Entre mochos...


Entre mochos e oboés
de sons desarticulados
errei até ser dia,
com passos mal andados...
na planície gelada
...que frio fazia...
naquela madrugada...

MJB

4.2.08

Natureza


Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é.
Mas porque a amo, e amo-a por isso,
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem por que ama, nem o que é amar...




Fernando Pessoa

2.2.08

Árvores do Alentejo

Árvores do Alentejo

Horas mortas... Curvada aos pés do Monte
A planície é um brasido e, torturadas,
As árvores sangrentas, revoltadas,
Gritam a Deus a benção duma fonte!

E quando, manhã alta, o sol posponte
A oiro a giesta, a arder, pelas estradas,
Esfíngicas, recortam desgrenhadas
Os trágicos perfis no horizonte!

Árvores! Corações, almas que choram,
Almas iguais à minha, almas que imploram
Em vão remédio para tanta mágoa!

Árvores! Não choreis! Olhai e vede:---
Também ando a gritar, morta de sede,
Pedindo a Deus a minha gota de água!
Florbela Espanca

Quero só trazer à memória o que me dá esperança...

Hino da Restauração da Independência



A PORTUGUESA